A situação de catástrofe económica
e social em que Portugal se encontra sem possibilidade de resolução a curto ou
médio prazo, o sentimento resultante da perspectiva do nosso futuro miserabilista,
a ausência de expectativas futuras para a geração dos mais novos envolvendo
filhos e netos, a convicção da impunidade imoral em que vivem os nossos ex. e
actuais políticos todos eles responsáveis pela actual crise, são razões mais do
que suficientes para o actual sentimento de revolta que nos envolve.
Não me constituo como uma
excepção.
O direito à indignação é um dos
direitos fundamentais das democracias, e não me envergonho por senti-la.
Tudo está posto em causa.
O Estado Social faliu mas os
responsáveis por décadas de erros acumulados continuam a usufruir do bem-estar
dos intocáveis.
Vejam-se os políticos, os
banqueiros, os economistas, os gestores todos eles crânios iluminados no meio
de uma horda de jumentos.
Nasci e estudei dentro dos
padrões socialmente instituídos.
Desenvolvi o saber e o
conhecimento ascendendo numa carreira após incontáveis concursos públicos e nunca
por nomeação.
Trabalho na função pública há
trinta e nove anos
Não tenho subvenções vitalícias
nem nunca recebi qualquer premio pecuniário atribuído á minha dedicação.
À minha profissão de médico e de
cirurgião, entreguei todo o meu esforço, todo o meu empenho, toda a minha
paixão, procurando acima de tudo o melhor para os meus doentes.
Falhei em muitos casos, mas em
muitos consegui ajudar compensando as derrotas que sempre me penalizaram.
Mantive e desenvolvi o caracter
que genética e que de forma comportamental me foi transmitido.
Procurei ser sempre honesto,
metódico e trabalhador.
Procurei seguir os modelos e os princípios
éticos e morais que me ensinaram.
Contrastando com toda esta
dinâmica, presentemente custa-me ver a dificuldade presente e futura dos
trabalhadores incluídos na minha geração.
Pensámos que poderíamos ter um
fim de vida confortável, sem luxos mas com a dignidade suficiente para nos
mantermos interessados na vida.
Custa-me também ver a ausência de
perspectiva dos nossos filhos, famílias separadas pela necessidade de encontrar
trabalho, filhos adiados pela incapacidade económica para os ter e manter,
cêntimos contados á exaustão, ausência de sonhos, ausência de perspectivas,
tristeza, dificuldade, revolta.
É a indignação e revolta que lentamente
toma conta de todos nós.
E nada é mais perigoso do que
isto.
Somos considerados um povo de
brandos costumes, mas tivemos revoltas, defenestrados, e regicidas.
O lume arde em fogo brando mas
dum momento para o outro pode atear e tornar-se incontrolável.
Nesse momento, muitos terão procurar
um refúgio para não sofrerem graves queimaduras.